STF VALIDA LEI QUE PROÍBE TESTES DE COSMÉTICOS EM ANIMAIS

 

STF VALIDA LEI QUE PROÍBE TESTES DE COSMÉTICOS EM ANIMAIS

Nesta quinta-feira, 27, o plenário do STF julgou constitucional a proibição de testes de cosméticos em animais prevista em lei do Estado do RJ.

Por maioria, os ministros também decidiram que, embora o Estado-membro possa, sim, dispor sobre a proibição dos testes; o ente-federado não pode proibir a comercialização de produtos testados em animais, pois é competência privativa da União legislar sobre comércio interestadual. Veja como ficou o placar:

Testes em animais

A ação foi ajuizada em 2018 pela ABIHPEC – Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos contra a Lei nº 7.814/17, do Estado do RJ.

“Em síntese, ao estabelecer a proibição peremptória da utilização de animais para desenvolvimento, experimento e teste de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes, a Lei impugnada incorre em inconstitucionalidade formal por violação das regras de competência legislativa previstas nos artigos 22, I e 24, V, VI e §1º a §4º da Constituição Federal de 1988, já que a União, por meio da edição da Lei Federal nº 11.794, de 8 de outubro de 2008, não somente permitiu a conduta como também estabeleceu os procedimentos necessários para o uso científico de animais.
(…)
A inconstitucionalidade fica ainda mais evidente quando se verifica que a lei impugnada proíbe a venda de produtos derivados da realização de testes em animais no Estado do Rio de Janeiro (art. 1º, parágrafo único), bem como estabelece obrigação de rotulagem aos produtos cosméticos, de higiene pessoal, perfumes, de limpeza e seus componentes (art. 4º). A Lei impugnada extrapolou, e muito, a competência reservada aos Estados-membros, pois, além de contrariar a norma geral federal, estabeleceu comandos que impactam a produção, consumo e relações privadas de natureza civil e comercial.
(…)
Tem-se, portanto, que a lei impugnada contrariou a diretriz nacional estabelecida pela Lei Federal nº 11.794/08, gerando uma indesejada antinomia que afeta negativamente a indústria de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos como um todo.
(…)
Quanto à proibição da utilização de animais para desenvolvimento, experimento e teste de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes, a inconstitucionalidade formal é latente, já que existe a Lei Federal nº 11.794, de 8 de outubro de 2008, que não somente permite a realização de testes em animais, mas também estabelece as normas gerais que disciplinam o tema, ocorrendo, portanto, violação do art. 24, V, VI e §§ 1º, a 4º da Constituição Federal, que regula a competência concorrente da União e dos Estados”.

A lei “proíbe a utilização de animais para desenvolvimento, experimentos e testes de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, sem prejuízo de proibições e sanções previstas em outros dispositivos legais: municipal, estadual ou Federal”.

O artigo 1º da lei dispõe o seguinte:

“Art. 1º – Fica proibida, no âmbito do Estado do Rio de Janeiro, a utilização de animais para desenvolvimento, experimento e teste de produtos cosméticos, higiene pessoal, perfumes, limpeza e seus componentes.
Parágrafo único – Fica também proibida a comercialização dos produtos indicados no caput deste artigo, quando derivados da realização de testes em animais.”

A Associação também impugnou o artigo 4º da lei, que estabelece uma obrigação de rotulagem aos produtos cosméticos, de higiene pessoal, perfumes, de limpeza e seus componentes. Para a Associação, a Assembleia Legislativa do RJ, ao editar a norma, usurpou a competência conferida à União para (i) estabelecer normas gerais sobre fauna, conservação da natureza e proteção do meio ambiente (ii) estabelecer normais gerais sobre produção e consumo (iii) legislar privativamente sobre direito civil e comercial:

“A lei impugnada extrapolou, e muito, a competência reservada aos Estados-membros, pois, além de contrariar a norma geral Federal, estabeleceu comandos que impactam a produção, consumo e relações privadas de natureza civil e comercial.”

Estado pode proibir testes e pode proibir comercialização

Para Edson Fachin, a lei inteira do RJ é constitucional porque tem “nítido caráter de regulação protetiva do consumidor e do meio ambiente“. O ministro entendeu que não cabe ao Judiciário retirar a competência normativa de determinado ente da federação “sob pena de tolher-lhe sua autônima institucional“. De acordo com Fachin, a legislação estadual, ao estabelecer exigências para rotulagem e comercialização dos produtos, está atuando na esfera legislativa concorrente e não na esfera privativa da União.

Para Rosa Weber, a íntegra da lei fluminense é válida. Segundo a ministra, a legislação estadual, ao proibir o uso de animais para testes de produtos cosméticos, não regrou hipótese normativa contrária à lei 11.794/08.

No mesmo sentido, votaram Cármen Lúcia, Marco Aurélio e Luiz Fux. Para os ministros, a lei trata de um “avanço de humanidade” e não há nenhuma inconstitucionalidade na norma.

Estado pode proibir testes, mas não pode proibir comercialização

Gilmar Mendes acolheu o pedido da Associação de forma parcial, de modo a validar a proibição de testes em animais, mas julgar inconstitucional a proibição da comercialização dos produtos testados em animais e a obrigação de rotulagem aos produtos cosméticos.

O ministro explicou que o STF tem reconhecido a possibilidade de os Estados ampliarem proteções dadas por norma Federal, especialmente, quando voltadas ao direito à vida e à proteção do meio ambiente. Como exemplo, Gilmar Mendes citou a lei fluminense 5.517/19, que vedou o consumo de cigarros, e afirmou que a norma não extrapolou o âmbito de atuação legislativa e nem exacerbou a competência concorrente para legislar sobre saúde pública.

O relator frisou que o conteúdo da lei fluminense e o da lei Federal 11.794/08 veiculam hipóteses normativas distintas, “assim, a rigor, não há que se falar em usurpação de competência da União para editar leis gerais sobre o tema definido no art. 24,6º da CF“.

No entanto, Gilmar Mendes entendeu que o parágrafo único da lei e o seu artigo 4º – que regulam a comercialização e a rotulagem dos produtos testados em animais – afronta a CF: “a vedação imposta genericamente a toda e qualquer produto no Estado do RJ sema distinção de sua respectiva origem parece invadir a própria competência da União para legislar sobre comércio interestadual“.

Não vejo nessa norma nada que afronte a lei Federal“, afirmou Alexandre de Moraes. O ministro frisou que todos os entes federados têm o dever da proteção da fauna e da flora. Para Moraes, a lei Federal excepcionou o uso de animais apenas para ensino e pesquisa científica: “a regra é a proteção aos animais“, não incluindo os testes para indústrias cosméticas.

Não se justifica uma exploração aos animais para questão cosmética, principalmente na atual fase em que a química permite várias outras possibilidades.”

Alexandre de Moraes seguiu Gilmar Mendes no que se refere à comercialização dos produtos. Para o ministro, se “fecha as fronteiras” para a comercialização dos produtos e fere competência da União para legislar sobre comércio interestadual. Assim, julgou parcialmente o pedido.

Luís Roberto Barroso afirmou que há competência concorrente do Estado para legislar sobre fauna e proteção ambiental. Dessa forma, o ministro disse não ter “dúvida em afastar a alegação de inconstitucionalidade formal para assentar que o Estado pode, sim, prover acerca dessa matéria“.

Além disso, o ministro observou que a proteção dos animais evoluiu para reconhecê-los como seres sencientes, capazes de sofrimento de sentir dor. “Acho que evoluímos para uma proteção autônoma dos direitos dos animais“, disse. Todavia, quanto à comercialização dos produtos testados, Barroso entendeu que a previsão é inconstitucional, por entender que o Estado usurpou competência privativa da União.

Em breves votos, Dias Toffoli e Ricardo Lewandowski seguiram o relator.

Estado não pode proibir testes em animais

Nunes Marques votou por invalidar a lei; ou seja, na prática o voto do ministro vai no sentido de liberar os testes em animais para indústrias cosméticas. De acordo com o ministro, não há qualquer peculiaridade regional do Estado do RJ justificadora da edição de uma lei “discrepante” daquelas existentes ou inexistentes na maioria dos outros Estados-membros da União.

Para o ministro, a proibição deve ser feita pela União, em disciplina uniforme. Nunes Marques, frisou que não é despropositado imaginar que a permissão para que Estados legislem sobre a proteção de animais na atividade industrial pode conduzi-los a uma guerra de regulamentação, semelhante àquela que se passou com os tributos. “Uma regulamentação fragmentada pode levar a perplexidades“, afirmou.

 

fonte: http://www.sbadvocacia.com.br/site/?p=9782